Blog do Paullo Di Castro


quarta-feira, 29 de fevereiro de 2012

Religião x Estado




Três personalidades, três extremos, três influências, três líderes cristãos que viraram notícia em três dias. As comparações entre eles param por aí. O motivo das manchetes diferem bastante, e infelizmente, para muitos são farinhas do mesmo saco. É preciso um exercício de despir-se de generalizações para poder de forma clara se entender quem de fato são e qual a realidade de cada um.


Nessa quarta-feira o que pipocou nos jornais e mais ainda nas redes sociais foi o anúncio da presidenta Dilma do novo Ministro da Pesca, trata-se de Marcelo Crivella (PRB), senador que tem um longo histórico ligado como bispo da Igreja Universal do Reino de Deus. O que muitos não sabem é que o mesmo não faz mais parte dessa denominação, e a ligação com práticas polêmicas dessa e de seu líder Edir Macedo não fundamentam o trabalho parlamentar de Crivella. Pode-se argumentar que o mesmo não é qualificado para tal ministério. Mas quem o é? Já se foi uma polêmica a criação dessa pasta, desmembrada do Ministério da Agricultura.

As piadas e trocadilhos com passagens bíblicas são inevitáveis, dado o nome da pasta, daí se vê o rótulo impregnado na sociedade, que não vê naturalmente a inserção de líderes ligados a igrejas no poder. O senador já foi um defensor eficiente de Direitos Humanos e lavanta bandeiras sociais importantes no Congresso, as pessoas precisam separar a atuação política de qualquer ofício e ligações indiretas com pessoas de caráter duvidosos. Muitas análises entendem que a indicação ao cargo foi uma trégua do Planalto com a bancada evangélica, mas isso é negado pela mesma.


A afirmação é do deputado federal goiano João Campos (PSDB). Líder da Frente Parlamentar Evangélica e delegado de Polícia, daí se julga um perfil conservador, o que de fato é. Também criou bafafá na imprensa ao propor um Projeto de Decreto Legislativo para tornar sem efeito a resolução que estabelece normas de atuação dos psicólogos em relação à orientação sexual dos pacientes. Com isso declarou não querer estabelecer o comportamento sexual como doença, mas dar autonomia para uma orientação. 

Isso significaria o direito de se tratar para uma mudança de opção sexual, aí o embate está formado tanto com a comunidade GLBT (não sei qual a última sigla usada), como para quem simplesmente não vê razões para se encaixar o comportamento em qualquer aspecto de saúde pública. Eu penso assim, com ressalvas. Dar orientação pode ser válido, enquanto for um conflito mental para a pessoa, caso contrário, o Estado não deve interferir. Isso dá muito pano pra manga, eis um bom estudo sobre o assunto aqui.


Muito diferente dos dois políticos, está o Bispo da Igreja Anglicana Robinson Cavalcanti, a trágica morte dele e de sua esposa sensibilizou o país, porém muito mais aqueles que acompanharam a obra literária, pregações e posicionamentos de muita relevância de quem tinha muita propriedade para falar. Pra mim não cabe discutir sobre adoção e o comportamento desequilibrado de um filho acolhido por ele e mergulhado nas drogas.

A muito admiro a sensatez e clareza desse ministro do evangelho. Não se resguardava de assuntos polêmicos e aplicava os ensinos bíblicos a uma perspectiva moderna diante das realidades seculares. Seu livro Cristianismo e Política - Teoria Bíblica e Prática Histórica, rompeu as barreiras que insistem em taxar a mistura de igreja e Estado com a atuação de quem professa uma fé cristã na política militante, indo muito além disso. Nada mais apropriado para se analisar o momento de Marcelo Crivella e João Campos. 
Para conhecer mais a história desse servo de Deus, leia aqui


quarta-feira, 22 de fevereiro de 2012

E agora, carnaval?



              E agora, carnaval?
              A festa acabou,
              a luz desligou,
              o povo sumiu,
              a noite esfriou,
              e agora, carnaval?
              e agora, folião?
              você que é sem nome,
              que veste abadá,
              você que faz enredo,
              que pula, extravasa?
              e agora, carnaval?
              Está sem mulata,
              está sem bateria,
              está sem alegoria,
              já não pode beber,
              já não pode agarrar,
              dinheiro já não há,
              a noite esfriou,
              a quarta de cinzas chegou,
              o ritmo se perdeu,
              o riso acabou
              não veio a utopia
              e tudo se findou
              e tudo fugiu
              e tudo se guardou,
              e agora, carnaval?
              E agora, carnaval?
              Sua falsa alegria,
              seu instante de delírio,
              sua gula e bebedice,
              sua mídia,
              sua estampa de ouro,
              seu terno de purpurina,
              sua incoerência,
              sua tristeza - e agora?
              Com a bandeira no chão
              quer abrir a porta,
              não existe abre-alas;
              quer morrer na avenida,
              mas a avenida abriu;
              quer ir para a Sapucaí,
              Sapucaí não há mais.
              carnaval, e agora?
              Se você gritasse,
              se você caísse,
              se você tocasse
              o samba portelense,
              se você desmaiasse,
              se você cansasse,
              se você morresse...
              Mas você não morre,
              você é duro, carnaval!
              Sozinho sem apitos
              qual bicho-do-mato,
              sem desfiles,
              seu carro desmontado
              para se encostar,
              sem Globeleza
              que sambe a galope,
              você marcha, carnaval!
              carnaval, para onde?*
       
Após um período de férias, o Feira de Assuntos volta para ser espaço de opinião, reflexão, edificação e troca de idéias. Novidades no lay-out, ferramentas e conteúdos estão por vir. O blog, assim como muita coisa nesse país, volta agora, mas 2012 já começou com tudo, desde o primeiro dia de janeiro para os em sã consciência e de atitude, e espero que cada vez menos essa dita festa popular seja o divisor do calendário para dar início de fato a um novo ano. Enquanto essa mentalidade estiver na cabeça do brasileiro, as consequências dessa prevaricação irão ser cada vez mais prejudiciais. 


* Paráfrase do poema "E agora, José?" de Carlos Drummond de Andrade.